A MEMÓRIA E A SUA INFLUÊNCIA NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM
- ESPAÇO PSICOLÓGICO MENTE SÃ
- 12 de ago. de 2017
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1. Memória

A memória é o processo cognitivo que compreende a retenção e a recuperação da informação. É um sistema aberto em que a informação é adquirida (aquisição e codificação), armazenada (retenção), podendo depois ser recuperada ou evocada (recordação). Lembrar implica um processo ativo de reconstrução das informações e estímulos anteriormente adquiridos, codificados e armazenados.
1.1 Definição do Conceito
Segundo Sternberg (2000) a memória é o meio pelo qual se recorre às suas experiências passadas, a fim de usar essa informação no presente.
A Memória é a capacidade de adquirir, armazenar e recuperar as informações disponíveis. Para Lent (2001), há uma sequência de eventos nos processos mnemónicos, o primeiro é a aquisição da informação, segue-se o armazenamento e por último a recuperação da informação através da recordação.
1.2 Fases da Memória
A prespetiva orientada pelos processos, tem ajudado a compreender que as estratégias usadas em qualquer das fases do processo mnésico: aquisição, retenção e recuperação da informação, são fundamentais e interdependentes, ou seja a utilização de uma estratégia numa das fases, condiciona o desempenho otimizado se não estiver presente na noutra fase.
Sternberg (2000), descreve que os psicólogos cognitivos identificaram três operações comuns da memória: codificação, armazenamento e recuperação.
Aquisição: antes de recordar temos de aprender, sem aprendizagem não há memória. A aprendizagem pode ocorrer de diferentes formas e depende da atenção que dámos ao evento ou acontecimento. Através da atenção, ignoramos os estímulos que não têm interesse para nós e retemos os que consideramos importantes, mas para os conservar é necessário a sua codificação. A codificação diz respeito à forma como um item de informação é colocado na memória.
Retenção ou Armazenamento: é a capacidade de reter e conservar as informações, e serão utilizadas sempre que necessário. A retenção pode permanecer por períodos mais ou menos longos. Para que seja recordada, a experiência codificada tem de deixar algum registo no sistema nervoso (traço mnésico), este tem de ser armazenado de forma permanente para permitir a sua utilização futura. A retenção é uma condição necessária para a recuperação pois não se recorda o que não se sabe.
Entrada (input) Armazenamento / Processamento Saída (output)
Recuperação ou Ativação: quando se torna necessário as informações são ativadas e recuperadas, para as utilizar na experiência presente. É o momento em que o indivíduo tenta lembrar-se dos conteúdos que armazenou anteriormente. Uma das formas de recuperar as informações armazenadas é através da recordação, que diz respeito aos nossos esforços para produzir informação a partir da memória, em resposta a um determinado estímulo. Os processos de recordação são responsáveis pelo acesso à informação retida na memória e incluem, entre outros, processos explícitos ou diretos como a evocação e reconhecimento e processos implícitos ou indiretos como a reaprendizagem e ativação (priming).
2. Tipos de Memória
Os processos de retenção ou processos de armazenamento são responsáveis pela conservação da informação na memória. No entanto, a memória não é um sistema único, é antes um sistema formado por vários sistemas ou componentes que armazenam conhecimentos de natureza e períodos de tempo diferentes.
Os principais sistemas de memória são a memória sensorial, a memória de curto prazo e a memória de longo prazo, estes são processos sequênciais e operam de modo diferente.
A organização da memória humana é geralmente concebida como sendo composta por três processos distintos.
O primeiro processo é responsável pelo reconhecimento de padrões e dá-se na Memória Sensorial-Motora, que envolve a associação entre um significado e um padrão sensorial. Trata-se de um sistema de memória que, por meio da perceção da realidade pelos sentidos, retém por alguns segundos a imagem detalhada da informação sensorial recebida por algum dos orgãos dos sentidos. É responsavel pelo processamento inicial da informação sensorial e da sua codificação.
O segundo processo ocorre na Memória de Curto Prazo, que recebe as informações anteriormente codificadas pelos mecanismos de reconhecimento de padrões da memória Sensorial-Motora e retém as informações por alguns segundos, talvez alguns minutos, para que sejam utilizadas, eliminadas ou até mesmo armazenadas.
O terceiro processo acontece na Memória de Longo Prazo, esta memória obtém as informações da Memória de Curto Prazo e armazena-as. A sua capacidade de armazenamento é ilimitada e as informações ficam armazenadas por períodos de tempo muito longos.
2.1 Memória Sensorial
A memória sensorial é um sistema de memória que retém por alguns segundos a imagem detalhada da informação sensorial recebida pelos órgãos dos sentidos.
Existem diferentes tipos de memória sensorial : visual, auditiva, olfativa, tátil e gustativa. Os dois tipos de memória sensorial mais relevantes são a visual e a auditiva. São os nossos sentidos que conduzem as informações sensoriais dos estímulos ao sistema da memória.
A memória visual ou icónica (ícone significa imagem) permite-nos percecionar o movimento, por exemplo quando vemos um filme, já que retemos por um curto período de tempo as imagens, o que nos possibilita fazer a ligação entre os diversos fotogramas.
A memória auditiva ou ecóica (eco significa repetição) permite-nos perceber o que ouvimos, pois retemos a informação auditiva por um curto espaço de tempo, possibilitando a ligação das frases de um discurso.
A memória sensorial é constituída por imagens percetivas que normalmente se perdem, mas que poderão ser processadas no armazenamento a curto ou longo prazo.
2.2 Memória de Curto Prazo
A memória a curto prazo é uma memória que retém a informação durante um tempo curto e limitado, a partir do qual essa mesma informação pode ser esquecida ou movida para a memória a longo prazo (Albuquerque, 2001).
Distinguem-se ainda dois tipos de memória: a memória imediata e a memória de trabalho. Ambas completam-se e formam a memória de curto prazo.
A memória imediata é aquela que retém a informação apenas por uma fração de tempo (até 30segundos). Normalmente, conseguimos reter até sete unidades de informação: sete dígitos, sete letras, etc.
A memória de trabalho acontece quando mantemos a informação enquanto ela nos é útil, por exemplo quando repetimos um nome ou um número várias vezes porque não o pudemos escrever.
Qualquer informação que tenha estado na memória a curto prazo e que se tenha perdido é irrecuperável.
Segundo Sternberg (2000), o número de sílabas que pronunciamos com cada item afeta o número de itens que podemos evocar, ou seja quando cada item tem um maior número de sílabas, podemos lembrar menos itens. Além disso, qualquer atraso ou interferência pode levar a nossa capacidade de sete itens, cair para cerca de três.
Apesar da capacidade da memória a curto prazo ser pequena, lidamos com uma quantidade enorme de informação e será sobre esta que se desenvolverá a aprendizagem, o raciocínio e a imaginação. O registo da informação na memória de curto prazo é efetuado a partir de processamentos prévios que ocorrem na memória sensorial e constituem uma primeira, e por vezes decisiva, fase de atribuição de significado à informação processada.
O registo da informação de curto prazo está sujeito a um rápido esquecimento, a menos que seja repetida e com isso transferida para a memória a longo prazo.
2.3 Memória de Longo Prazo
A Memória de Longo Prazo tem uma capacidade de armazenamento ilimitada e pode ser armazenada por tempo indeterminado. A recuperação da informação exige algum esforço do organismo. A informação armazenada pode ser temporáriamente recuperada e transferida para a memória de curto prazo.
Há dois tipos de memória de longo prazo: a memória explícita e a memória implícita.
A Memória Explícita implica consciência do passado, de experiências vividas, de acontecimentos, etc. Esta memória refere-se a tudo aquilo que só podemos evocar por meio de palavras, e pode ser episódica, quando envolve a memória de eventos que possuem uma etiqueta temporal (que acontecerem em determinado momento no tempo) ou semântica, quando envolve a memória das ideias e dos conceitos atemporais.
A memória episódica é constantemente associada à memória autobiográfica, uma vez que se reporta a lembranças da vida pessoal. Envolve rostos de pessoas, músicas, fatos, experiências. É pessoal e manifesta uma relação íntima entre quem recorda e o que se recorda. Por exemplo: a memória episódica é utilizada para nos recordarmos do que fizemos no último aniversário. Tulving (1985, p. 387) definiu a memória episódica como a recordação consciente de
“acontecimentos pessoalmente vividos enquadrados nas suas relações temporais”.
A memória semântica permite identificar objetos e conhecer o significado das palavras. Refere-se ao conhecimento geral sobre o mundo: leis, fatos, fórmulas, regras, etc. Não há localização no tempo, nem ligação com qualquer ação ou conhecimento específico. Por exemplo: a memória semântica é utilizada para nos recordarmos que a capital de França é Paris. Tulving (1972, p. 386) definiu a memória semântica como “uma enciclopédia mental do conhecimento organizado que uma pessoa mantém sobre palavras e outros símbolos mentais”, tendo mais tarde alargado o seu âmbito para incluir “o conhecimento do mundo de que um organismo seria portador” (Tulving, 1985, p. 388).
A Memória Implícita diz respeito aos comportamentos que podem ser atribuídos a processamentos anteriores sem que, no momento da realização desses comportamentos haja consciência do episódio do seu processamento. A memória implícita não precisa ser descrita com palavras. Na realidade, ainda que desejemos descrevê-la com palavras, a verbalização é muito difícil ou mesmo impossível. Da memória implícita faz parte a memória de procedimentos.
A memória de procedimento reúne os hábitos, as habilidades aprendidas e as regras em geral, como por exemplo, a série de movimentos necessária para se tocar um instrumento, andar de bicicleta ou as regras gramaticais necessárias para se construir adequadamente uma frase.
3.esquecimento
A memória é seletiva e limitada na sua capacidade de armazenamento. Por isso, o esquecimento é condição essencial ao normal funcionamento da memória.
Podemos definir esquecimento como a incapacidade de recordar, de recuperar dados, informações, experiências que foram memorizadas no passado. O esquecimento pode ser provisório ou definitivo. O esquecimento é essencial pois só continuamos, ao longo de toda a vida a memorizar informação, porque conseguimos esquecer outra. O esquecimento tem uma função seletiva e adaptativa, já que despreza a informação inútil e desnecessária e os conteúdos conflituosos, impedindo um excesso de informação acumulada no cérebro que bloquearia a captação de novas informações.
O esquecimento está, normalmente, mais relacionado com a memória a longo prazo uma vez que, na memória a curto prazo, o tempo de retenção da informação é demasiado curto e passa para a memória a longo prazo ou é apagada.
Segundo Izquierdo (2006), esquecemos a maior parte das informações que chegam até nós. Várias teorias já foram propostas para esclarecer porque isso acontece (Sternberg, 2008). Entre elas, estão a Teoria da Interferência e a Teoria da Deterioração.
4 Aprendizagem
Aprendizagem é uma modificação relativamente estável do comportamento ou do conhecimento, que resulta do exercício, experiência, treino ou estudo. É um processo que, envolvendo processos cognitivos, motivacionais e emocionais, manifesta-se em comportamentos.
No entanto, é preciso notar que nem todas as mudanças de comportamento resultam da aprendizagem. Alguns comportamentos atualizam-se naturalmente sem necessidade de aprendizagem porque fazem parte da matriz genética.
A aprendizagem é um processo cognitivo que nos humaniza, sendo essencial na adaptação ao meio. Segundo Campos (1986, p.30) “A aprendizagem pode ser definida como uma modificação sistemática do comportamento, por efeito da prática ou da experiência, com um sentido de progressiva adaptação ou ajustamento.”
“A aprendizagem é uma capacidade que pomos em acção quotidianamente para dar respostas adaptadas às solicitações e desafios que se nos colocam devido às nossas interacções com o meio” (Jorge Pinto, 1999).
A memória serve para aprender, logo devemos ter em conta o conceito de aprendizagem, já que “A aprendizagem e a memória estão intimamente relacionadas, …” (Rosário, 2004). Podemos dizer que a aprendizagem é a mudança manifesta de comportamento como resultado de influências práticas ou experienciais. Além disso, ela é também o processo mediante o qual interiorizamos uma série de comportamentos e capacidades intelectuais.
É devido à capacidade para aprender, que o ser humano consegue uma melhor adaptação ao meio que o rodeia. A maior parte da aprendizagem que o homem adquire é consequência da imitação de outras pessoas. A memória intervém decisivamente no processo de imitação, já que ela permite a retenção daquilo que se observa para posterior reprodução.
Aprendemos de forma consciente e com o objetivo de que as aprendizagens nos possam servir no futuro.
Um outro aspeto tem a ver com o período de aprendizagem, já que este tem a mesma duração que a existência da pessoa, pois a aquisição de novos conhecimentos só termina com o desaparecimento do indivíduo.
4.1 Aprendizagem e Memória
Compreender a memória humana é uma das tarefas importantes da pesquisa psicológica e dos psicólogos cognitivos.
A aprendizagem é o processo através do qual nós adquirimos conhecimento, já a memória é o processo pela qual essa aprendizagem é codificada, retida e posteriormente evocada ou recuperada. A aprendizagem é um processo pelo qual nós adquirimos novos conhecimentos, por sua vez a memória é o processo pelo qual retemos os conhecimentos aprendidos.
Riesgo (2006) afirma ainda que, do ponto de vista neurobiológico, existe algo como um “filtro” que classifica as informações em conhecidas ou desconhecidas. “É justamente aqui que reside a relação entre memória e a aprendizagem, na distinção entre as informações já consolidadas e as inteiramente novas” (RIESGO et al., 2006, p. 270).
A memória e a aprendizagem estão intimamente relacionadas, são processos complementares. Sem memória os processos de aprendizagem estavam sempre a iniciar-se, pondo em causa todo o processo de adaptação do ser humano, pois é a partir de aprendizagens retidas que se processam novas aprendizagens. Por isso, a memória é fundamental ao permitir que as aprendizagens se mantenham e possam ser utilizadas quando necessário.
Aprendizagem e memória são conceitos fundamentais para a noção da individualidade. A forma peculiar de nós pensarmos, sentirmos e agirmos depende do que aprendemos e armazenamos na nossa memória durante a nossa vida. Cada indivíduo vive experiências distintas, por isso as pessoas terão, forçosamente, memórias e histórias diversas para contar, bem como mentes singulares para assimilar novos conhecimentos.
Para Cardoso (2006) a memória é uma faculdade cognitiva extremamente importante porque forma a base para a aprendizagem. Assim a memória envolve um complexo mecanismo que abrange o arquivo e a recuperação de experiências, portanto está intimamente associada à aprendizagem.
Considerando-se que a aprendizagem envolve a função intelectual do ser humano, e que esta só é possível a partir das informações que temos registadas na memória, ou seja informações memorizadas, podemos dizer que os processos de memorização trazem influências diretas na aprendizagem.
Aprender envolve o raciocínio, que nada mais é do que comparar informações que temos na memória. Podemos dizer que existe diferença entre: aprender e lembrar, sendo que ambas as habilidades são complementares e essenciais para o desenvolvimento de um processo de aquisição de novos conhecimentos.
Pode afirmar-se que não há aprendizagem sem memória: é graças à memória e aos processos mnésicos que retemos o que aprendemos.
Referência
COSTA, Paula. A MEMÓRIA E A SUA INFLUÊNCIA NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM. 2012.
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